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Nesta Edição » Entrevista » A Matemática financeira é simples

Revista – Por que a previdência complementar é importante hoje?

José Dutra – Ontem estava conversando com um amigo e ele me disse: "Dutra, estamos ficando velhos"... E qual o problema disso? É que as coisas ficam difíceis para o velho. Se ele tem, por exemplo, um seguro de vida de morte natural, à medida que ele vai envelhecendo o banco fica louco para expulsar o cara. Plano de saúde, a tendência é que os planos se tornem mais caros. Se o cara se aposenta pela Previdência Oficial, com salário de R$ 10 mil, o nível de renda cai para, no máximo, R$ 3,2 mil. Se não tiver a preocupação com uma previdência complementar, a situação fica difícil. Está certo que ele vai ter gastos menores com transporte e vestuário, mas aumenta o que despende com saúde. Aí é muito importante que tenha uma aposentadoria complementar para que possa sobreviver com tranquilidade.

Revista – Muita gente não considera ao comprar um bem ou fazer uma poupança a importância dos juros ao longo do tempo. Isso é um erro?

José Dutra – A propensão do brasileiro médio é mais de tomar dinheiro emprestado do que aplicar. Mas por quê? Primeiro, quando você fala que ele vai ganhar meio por cento ao mês, como no caso da poupança... Em 2009, por exemplo, rendeu 6,91%. Se a pessoa aplicou R$ 100, ganhou R$ 6,91 no ano, o que parece pequeno. O brasileiro já não tem a cultura de poupar e, se acha que a rentabilidade é muito baixa, tem pouca propensão a fazer isso. Como se resolve esse problema cultural? Resolve-se informando. Nossa imprensa não valoriza a educação financeira. Poderia, por exemplo, divulgar se a pessoa aplicar tanto por mês o quanto teria em X tempo de maneira real.

Revista – O senhor diz que falta informação de qualidade na imprensa sobre o mercado financeiro. Que tipo de informação?

José Dutra – Primeiro, sou professor de matemática financeira e ela é extremamente simples, calcada em meia dúzia de fórmulas, meia dúzia de regrinhas que não são complicadas. Não é difícil um jornalista entender melhor para depois escrever uma matéria e explicar para seus leitores. Mas veja o seguinte, se o jornalista tem dificuldade de entendimento, como vai explicar para o leitor? Um jornal de grande circulação nacional soltou uma vez matéria em que comparava financiamento imobiliário com consórcio e aluguel. Pois bem, no artigo havia pelo menos cinco afirmações falsas, por exemplo, que o sistema SAC (Sistema de Amortização Constante, N.R) é melhor que a tabela Price, porque somou o valor das prestações e deu um resultado na conta pura e simples. Mas ele esquece que na matemática financeira tem uma coisa chamada prazo, que tem influência enorme nisso. A informação é falsa. Outra é que se está pagando aluguel de R$ 800, se fosse pagar um financiamento pagaria R$ 1.200. Então se pegasse os R$ 800 e aplicasse, dali a certo tempo compraria o imóvel sem fazer financiamento. Mas se esqueceu de considerar variáveis como a valorização do imóvel no tempo. Quando falam em consórcio, então, é uma temeridade ao comparar com outros tipos de financiamento, porque não tem sentido essas comparações. Com um pequeno esforço acho que se poderia resolver isso. Mas como a gente vai ensinar matemática financeira se a própria imprensa tem dificuldade em entender? Daí fica difícil explicar para a população mais carente.

Revista – Vamos abordar um ponto que também é pouco divulgado e as pessoas prestam pouca atenção, que são as taxas de administração, essenciais para o rendimento de uma aplicação ou para o resultado de um fundo de pensão.

José Dutra – Nos fundos de investimento, muita gente continua pagando taxas de administração por volta de 3% ao ano, por exemplo. Aí nem é preciso fazer muita conta, porque esse cara já está com rendimento líquido, descontado imposto de renda, inferior à poupança. Só que o cara tem o dinheiro aplicado, não olha a rentabilidade e, quando a instituição financeira informa, divulga o número bruto, antes do imposto. Porque a rentabilidade é dada pelo valor da cota em comparação com o mês anterior, mas isso ainda tem de ter o desconto do IR. Hoje dá para afirmar que se um fundo de investimentos cobra mais que 1% ao ano, seu rendimento já deve estar igual ou menor que o da poupança. E milhares de pessoas não sabem disso. Já no fundo de previdência privado, normalmente há duas taxas. A taxa de carregamento e a de administração. A de administração girava, até bem pouco tempo, em torno de 3% ao ano, e a de carregamento, antes, chegava a 10%. As pessoas precisam saber da existência dessas taxas, procurar entender qual o peso disso. Hoje essas taxas baixaram muito.

Revista – No caso de fundos de previdência, há um nível de informações adequado?

José Dutra – Vou dar um exemplo, há bem pouco tempo a coisa funcionava assim nos fundos de previdência privados: o sujeito ia escolher onde aplicar e chegava à agência de seu banco e falava, "para eu receber R$ 1 mil por mês na aposentadoria quanto eu preciso pagar"? As taxas com que se faziam as contas eram as mais variadas possíveis. Um jogava com rendimento real de 12% ao ano, outro com 6%, e o que acontecia? Aquele que jogava com 12% dizia, para receber R$ 1 mil você precisa aplicar, digamos, R$ 300 por mês. O outro falava que precisava de R$ 350, R$ 400, e ele achava que ali era mais "caro", sem entender que essa projeção não tem a menor validade, porque lá na frente a rentabilidade que der deu. O que ele precisaria saber é como foram feitas as projeções, quais os números usados, e sobre a necessidade de aplicar numa instituição idônea.

Revista – Hoje, se o senhor pudesse dar um conselho sobre a vida econômica das pessoas, qual seria?

José Dutra – Acho que, primeiro, tem de cuidar melhor de seu orçamento e, para isso, é fundamental que conheça um pouco de cálculo. E a notícia boa é que os cálculos não são tão complicados como muita gente pensa. Na realidade, nós, professores de matemática financeira, também complicamos muito em lugar de esclarecer de maneira didática aquilo que as pessoas efetivamente vão usar. Eu, por exemplo, dou aula para advogados que não têm muita noção de matemática, então qual a minha preocupação? É mostrar que a matemática financeira é extremamente simples, vamos conversando e mostrando isso, e eles vão ajudando a fazer. Você tendo essas noções pode calcular, por exemplo, prestações e montantes, como se acumula para se chegar em X meses e ter montante tal.

Revista – E em relação à aposentadoria?

José Dutra – Antes, o Estado era o pai de todos. Todo mundo vivia da aposentadoria oficial e não se preocupava com o futuro. Hoje, claro, quando se aposenta com 1 ou 2 salários mínimos, tem uma dificuldade enorme para se manter. E precisa entender que no mundo de hoje ele vai construir sua aposentadoria. Tem a oficial, para a qual ele contribui, que não vai acabar, mas terá importância muito menor. E é importante a noção de que vai viver daquilo que poupou durante o tempo da ativa. Mesmo a rentabilidade parecendo pequena mês a mês, no final de 30, 35 anos, é significativa.

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