Plano de Benefício foi feito para proteger participante
Ricardo Pena, secretário de Previdência Complementar, fala do que está sendo feito para garantir a boa situação dos fundos de pensão
Há poucos meses como titular da Secretaria
de Previdência Complementar
(SPC), órgão encarregado
de fiscalizar as Entidades Fechadas
de Previdência Complementar
(EFPC), como a PREVI, Ricardo Pena fala da criação
da Superintendência Nacional de Previdência
Complementar (Previc), cujo projeto se pretende
encaminhar ao Congresso Nacional. Fala também
sobre regras para a distribuição do superávit das
instituições e sobre mudanças na regulamentação
dos fundos. Veja os principais trechos da entrevista
concedida à Revista PREVI.
Revista PREVI – Como está o processo de
criação da Superintendência Nacional de Previdência
Complementar, a Previc?
Ricardo Pena – O anteprojeto de lei encontra-se na área de Recursos Humanos do
Ministério do Planejamento, onde estão sendo
feitos os cálculos das carreiras do futuro órgão
regulador dos fundos de pensão. Como essa
futura autarquia ou superintendência, substituta
da SPC, terá uma carreira de auditores
fiscais, com atribuição exclusiva de fiscalizar os
fundos, além de uma carreira de especialistas
– para analisar as autorizações e licenciamentos
– e ainda uma carreira de analistas, de pessoal
administrativo e de procuradores, o Ministério
do Planejamento está calculando o impacto que
essa medida terá, em termos de gastos, para o
governo. Dessa vez, estamos encaminhando-o
na forma de projeto de lei, com o objetivo de estruturar um órgão de fiscalização que tenha alguma
estabilidade. E também que tenha uma estrutura estável,
autárquica, com independência financeira, administrativa,
com quadros próprios e especializados. Queremos
que a previdência complementar tenha seus alicerces
mais bem estabelecidos, mais institucionalizados. Nos
últimos cinco anos, fizemos um trabalho bom, em termos
de supervisão e de regulação, mas em termos de estrutura
nós estamos com uma base ainda um pouco frágil, que
necessita ser reforçada com a criação da Previc.
Revista – Quais as diferenças da Previc em relação à
SPC?
Pena – Uma delas é a possibilidade de ser dotada de
autonomia administrativa, financeira e patrimônio próprio,
vinculado ao Ministério da Previdência Social, com
sede no DF e atuação em todo o território nacional, onde
atuaria como entidade de fiscalização e de supervisão das
atividades das Entidades Fechadas de Previdência Complementar
e da execução das políticas para o regime de
previdência complementar.
Eu acrescentaria que, além disso, a antiga MP 233 visualizava
e o atual projeto de lei mantém a possibilidade
de criação de um órgão no âmbito do Conselho Nacional
de Previdência Complementar (atual CGPC) e que
funcionaria como uma instância recursal: a Câmara de
Recursos da Previdência Complementar.
Diferentemente da SPC, a Previc terá um quadro
próprio de funcionários a ser constituído ao longo dos
próximos anos: 212 auditores, 50 procuradores, 120
especialistas, 100 analistas e 80 técnicos, aqui incluídos
especialistas em previdência complementar e pessoal
administrativo.
Atualmente, a SPC trabalha com auditores cedidos por
outros órgãos, sobretudo da Receita Federal. A Previc contaria
ainda com uma Procuradoria Federal, uma Ouvidoria
e uma Corregedoria próprias. E isso é importante, na
medida em que, atualmente, a SPC depende desses órgãos do Ministério da Previdência Social, já assoberbado com
os assuntos da Previdência Social.
A Previc será administrada por uma Diretoria Colegiada,
composta por um diretor-superintendente e quatro
diretores, “escolhidos entre pessoas de ilibada reputação e
de notória competência, a serem indicados pelo ministro
da Previdência Social e nomeados pelo Presidente da República”.
Outra vantagem será a possibilidade desse órgão
fiscalizador possuir um orçamento próprio, resultando de
uma taxa de fiscalização, a Tafic, arrecadada junto aos fundos
de pensão. Isso significaria que a Previc teria orçamento
anual de R$ 35 milhões, em lugar dos atuais R$ 2 milhões
conferidos pelo orçamento da União à SPC.
Custeada pela Tafic, o Estado se desonera. Bancada pela
SPC, pelo orçamento público, é toda a população que está
pagando para um segmento de 3% da população economicamente
ativa. Então acho que seria mais justo, do ponto
de vista orçamentário, cobrar apenas de um determinado
grupo. Até porque essa é a metodologia adotada por todos
os países que têm previdência complementar.
A isso acresce-se o fato de essa autarquia passar a
ser autofinanciável. A Previc, com uma estrutura mais
robusta, inclusive com seu potencial de mais de 300
funcionários, poderá ter uma regulação mais flexível e
uma supervisão mais inteligente, porque tal estrutura
perpassa governos e estaria imune a qualquer ação que
não fosse para o desenvolvimento e fortalecimento da
previdência complementar.
Revista – O senhor declarou que seria necessário usar
o período de “bonança” por que passam os fundos de
pensão para “preparar um colchão” para eventuais problemas
no futuro. Que cuidados seriam esses?
Pena – Eu estava me referindo à questão do superávit.
O superávit está em R$ 76 bilhões, de acordo com os
dados de dezembro de 2007, sendo que R$ 43 bilhões
são de reserva especial para ajuste do plano. Está além
do colchão dos 25% de reserva especial. Em tese, pela lei complementar, decorridos três anos, esse recurso poderia
ser utilizado para reduzir a contribuição ou para
aumentar o benefício. Até porque estamos tratando de
uma situação de desequilíbrio, algo anormal no sistema,
já que sempre nos preparamos para enfrentar os déficits
e as dívidas. Em tese, o plano de benefício não foi feito
para enriquecer o participante. Ele foi feito para proteger
o participante na fase não laborativa.
É desequilíbrio, eu costumo dizer, num momento de
bonança. É um bom problema, mas é um problema a ser
enfrentado. Ali tem interesses legítimos de participantes,
assistidos e patrocinadores. Uma questão importante é
que, nos últimos cinco anos, a economia ajudou muito os
fundos. A rentabilidade está muito grande. Comparado
a 2002, naquele período o sistema estava com déficit de
R$ 20 bilhões. Hoje está com superávit de R$ 76 bilhões.
Então a gestão foi muito boa. As condições econômicas
também. E essa questão do superávit tem que ser vista
em uma linha da preocupação com a maior solvência e
solidez do plano de benefícios.
Revista – E quanto às regras/critérios para distribuição
de superávits?
Pena – É preciso definir o que é superávit e a forma
de apuração desse superávit. O que a SPC pretende,
assim que sair o Plano de Contas, é ter uma regulação
mais firme sobre a questão da destinação do superávit
e também sobre o equacionamento do déficit. Até lá, o
que a gente pretende, no âmbito do Conselho de Gestão
de Previdência Complementar (CGPC), é poder regular
a matéria para as entidades. Seria mais uma medida no
âmbito de orientação, que pode sair na forma de recomendação
ou resolução para que as entidades, antes de
pensarem em destinar o superávit, possam percorrer
uma lista do ponto de vista de maior prudência e mais
conservadorismo. Por exemplo, para destinar o superávit
teria que se ver primeiro como é que está a dívida do patrocinador daquele fundo. Há entidade que tem dívida e
está querendo destinar o superávit. Seria prudente fazer
isso? Existem vários pontos que precisam ser equacionados
antes de se pensar nessa destinação. A minha idéia é
levar essa discussão para o CGPC, para que dali saia uma
deliberação com orientação para os fundos.
Revista – Como atender às expectativas dos associados
para a melhora de benefícios?
Pena – Com o cumprimento dos aspectos legais e
com a gestão prudencial dos recursos previdenciários
das EFPC.
Revista – O senhor também falou em certificação dos
dirigentes dos fundos de pensão. Como seria esse
processo?
Pena – A Certificação dos Dirigentes, conforme
prevê a Lei Complementar 109/01, artigo 35, para
atuar nas áreas financeira, atuarial, jurídica, contábil,
administrativa e de auditoria tem sido praticada pelo
mercado financeiro e de capitais. Os regimes próprios
de Previdência, no âmbito da Secretaria de Política de
Previdência Social (MPS), e os dirigentes vinculados
aos fundos de pensão, não podem ficar a reboque desta
nova realidade que se impõe.
O que se pretende com a certificação é um impulso, é o
alinhamento às melhores práticas na gestão de recursos
financeiros e previdenciários de terceiros.
A idéia é que a regulação possibilite formar esses estoques
de dirigentes num horizonte de quatro anos. A
SPC entende que isso é positivo, do ponto de vista de
melhoria nos processos e também no desempenho do
próprio fundo.
Haveria inclusive uma avaliação como tem a Ancor e
a Anbid, destinada a medir o conhecimento daqueles
dirigentes num prazo de quatro anos. Essa certificação
poderia ser gradual e por gradientes de envolvimento do
Conselho Fiscal, Conselho Deliberativo e da Diretoria
Executiva, diante das diferenças de certificação de cada
um. Seria avaliado o conhecimento de previdência, de
algumas operações no mercado financeiro, conhecimento
de atuária, conhecimento jurídico, de auditoria,
gestão, e de governança. Seria um nivelamento dos
dirigentes. A idéia, com isso, é aumentar, dar um outro
patamar, em termos de qualidade de gestão nos fundos
de pensão. Eu acho que dentro dessa agenda de educação
financeira e previdenciária essa iniciativa vai ajudar o
desenvolvimento do sistema.
Revista – Uma de suas preocupações é com relação à
avaliação de riscos para os fundos. Como esses mecanismos
podem ser aprimorados?
Pena – A resolução do Conselho Monetário Nacional
(CMN) que aprovou, em maio de 2007, a nova regra
de aplicação dos recursos administrados por fundos de
pensão, que ultrapassam R$ 410 bilhões, refletiu o amadurecimento
do sistema de previdência complementar,
permitindo, de forma equilibrada, maior flexibilidade na
gestão dos recursos pertencentes aos planos de benefícios
administrados pelos fundos de pensão. Para o futuro, em
primeiro lugar, cito a revisão do plano de contas, um dos
poucos itens ausentes de regulamentação. O objetivo, ao
discutir o tema, é aumentar a visibilidade e transparência
das operações dos fundos, dando tratamento, por exemplo,
para a questão das dívidas dos patrocinadores ou para as
despesas administrativas.
Outro ponto que merece regulação é a nova metodologia
de fiscalização – a supervisão baseada em risco –, inicialmente desenvolvida com o Programa Anual de
Fiscalização para identificar esses riscos e melhor alocar
os fiscais. Também temos a fiscalização indireta que monitora
as informações eletrônicas de investimento, atuária
e contabilidade para municiar a fiscalização direta.
Aponto ainda, como tema pendente de regulação, o
resseguro: uma opção que as entidades podem fazer para
reforçar a solvência do plano. Estamos em negociação
com a Susep – órgão também envolvido no setor – e já
identificamos alguns produtos que poderão ser utilizados
para reforçar a solvência dos planos de benefícios administrados
pelos fundos de pensão como a troca de tábua
de mortalidade e a oferta de garantias e de seguro para
benefícios de risco – invalidez e morte – e até mesmo para
eventos catastróficos.
Revista – Nos últimos anos, a SPC tem atuado para melhorar
e atualizar a legislação nessa área. Quais serão os
próximos passos?
Pena – Há uma microagenda regulatória, que precisa ser
encaminhada. Primeiro é o plano de contas, e alguns outros
assuntos pendentes; acho que essa será a última regulação
em termos de melhoria regulatória, de aperfeiçoamento
regulatório. Além da Previc, que trata de uma agenda
transversal, ainda temos uma frente de trabalho no campo
microrregulatório, que é: (I) a definição da nova planificação
contábil, alinhada ao novo padrão de convergência
contábil internacional, prevista para 2010; (II) as despesas
administrativas, tendo em vista que a norma atual é anacrônica na medida em que limita a visibilidade das operações
dos fundos de pensão; (III) a definição de superávit e
déficit, já que o momento é extremamente favorável para
essa discussão, tendo em vista os excelentes resultados obtidos
pelos fundos de pensão; (IV) a título de fomento, um
novo regramento para as transferências de gerenciamento
de planos, Convênio de Adesão Migração de Planos; (V) a
regulação da nova metodologia de fiscalização, a SBR/Supervisão
Baseada em Riscos; e (VI) resseguro.
Revista – Com a regulamentação atual e a fiscalização
que existe os participantes dos fundos de pensão podem
se sentir seguros em relação ao recebimento de seus
benefícios?
Pena – Sim, os fundos de pensão, enquanto investidores
institucionais, e cumpridores do dever fiduciário, podem
se sentir seguros, mas devem estar atentos a essa nova
realidade econômica que passará por um processo de
diversificação dos investimentos e por uma boa gestão de
riscos, sendo oportuno, então, a necessidade da educação
financeira com objetivos previdenciários.
Nesse sentido, a educação previdenciária articula-se
com outro objetivo estratégico da SPC, pois fortalece
indiretamente a fiscalização do sistema fechado de previdência
complementar, seja a partir da educação dos
participantes e assistidos, seja pelo desempenho dos Conselhos
(Fiscal e Deliberativo) da EFPC e pelas melhores
práticas de gestão dos dirigentes.
A perspectiva é que todo o trabalho desenvolvido pela
SPC, desde 2003, seja consolidado com a criação de uma
estrutura de supervisão, um órgão de Estado, nos moldes
da Previc, que esteja comprometida com políticas de longo
prazo, com quadros técnicos próprios e especializados,
que esteja imbuída de ações governamentais estáveis,
promova o desenvolvimento do sistema de previdência
complementar e possa reforçar a segurança e a solvência
dos planos de benefícios de modo a garantir os direitos
dos participantes e assistidos das EFPC.
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