capa
O futuro é agora
17º Encontro PREVI de Governança Corporativa reúne cerca de 400 conselheiros e executivos para debater o impacto das megatendências no destino das empresas
As empresas estão prontas para o futuro? Quais são as grandes tendências que estão se configurando na sociedade? Em que medida as organizações e a economia estão sendo afetadas? Devemos nos preocupar com essas mudanças? Essas foram algumas questões discutidas no 17º Encontro PREVI de Governança Corporativa.
O evento aconteceu no dia 5 de outubro, no Rio de Janeiro, e contou com a presença de cerca de 400 pessoas, incluindo presidentes de conselhos de administração e CEOs das empresas investidas, gestores de recursos e de bancos de investimento, instituições representativas do mercado de capitais, órgãos reguladores, fundos de pensão, além de conselheiros fiscais e de administração nas empresas participadas da PREVI.
O tema do Encontro deste ano foram as megatendências. Estamos falando dos fatores políticos, econômicos, tecnológicos e ambientais que podem decidir o destino das empresas nas próximas décadas. Palestrantes e público discutiram como se antecipar ao futuro para repensar, desde já, os seus negócios.
Cenário geopolítico
O professor da UFRJ e da Fundação Dom Cabral Francisco Carlos Teixeira da Silva abriu a programação do Encontro analisando as megatendências do cenário global. Segundo ele, o mundo passa por um momento de crise e transformação. Os Estados Unidos continuarão a ser a principal potência por muitos anos, mas não sem a concorrência de outros países emergentes, como a China ou a Rússia, que se reconstroem como influência global.
Isso pode representar uma oportunidade para o Brasil. “Com a mudança na governança mundial, há nova chance de o país voltar a ter crescimento”, explica Teixeira. Para isso, o Brasil tem de cumprir basicamente duas exigências: implantar uma gestão de transparência e definir seu marco jurídico. “É isso que vai atrair empresas e recursos para o nosso país, alavancando o crescimento”, ressalta.
Por outro lado, a indefinição do atual mapa geoeconômico global traz incertezas. “Temos também uma situação de crise mundial que poucas vezes vimos. Digo, com pesar, que este ano vivemos uma crise como a de Cuba nos anos 1960 ou como a Guerra do Vietnã, em 1973”, lamenta Teixeira.
Segundo o professor, as previsões para o mercado internacional não são muito positivas. “A economia mundial tem seu pior desempenho desde 2008, com a crise dos países emergentes e da Europa. No Brasil, não há uma crise total, como tivemos em 1929 ou no governo Collor. É bem melhor, mas, ainda assim, é preciso saber administrar as reservas. A inflação já começa a apresentar sinais de realinhamento dos preços, mas o déficit público ainda é grande, assim como a redução do consumo e o desemprego”, lembra.
“A questão central para a crise hoje é mais educação – pensando em educação como a possibilidade de gerar inovações –, transparência e segurança jurídica, ou seja, ter certeza de que os contratos jurídicos estão aí para valer”, afirma.
Mudanças climáticas
Celso Lemme, professor da Coppead UFRJ, aprofundou o debate acerca da megatendência ‘Mudanças Climáticas’. Segundo ele, é preciso estudar não apenas os riscos, mas as oportunidades que batem à porta em função desse fenômeno. “Muitas empresas já têm boas estratégias definidas, algumas com iniciativas de baixo custo que podem ser logo colocadas em prática”, destaca.
Nesse sentido, Lemme acredita que os fundos de pensão devem levar em conta as mudanças climáticas como fator de influência na tomada de decisões de investimento. Para isso, pode ser necessário fazer realocações estratégicas nos portfólios e salienta que “O caminho é assumir compromissos espontâneos relacionados às mudanças climáticas e apoiar inovações e melhorias de processos”.
Mercado global
O Encontro também abordou megatendências específicas que afetam o Mercado Global. Para o professor da Fundação Dom Cabral Christian Lohbauer, é preciso pensar o futuro agora. “Países como o Japão e os EUA sempre pensaram suas sociedades olhando muito à frente. Nós, brasileiros, não fomos acostumados a isso. Mas, se queremos crescer, essa é a hora de mudar a relação e repensar nossas ações, com visão de longo prazo”, alerta.
Lohbauer falou sobre quatro aspectos dentro destas megatendências do Mercado Global. “A primeira é quase uma obviedade: a emergência da Ásia como novo centro de pujança da economia mundial. Isso vai muito além do crescimento da China, estamos falando do boom de toda uma região: da Indonésia, da Coreia e outros países, sem falar no subcontinente Indiano. Em 50 anos, o eixo da economia se voltará para o outro lado do planeta”. Outro fator de influência nesse contexto é a tecnologia: “Os Estados Unidos serão a grande fonte de inovação nos próximos 50 anos. A América Latina, que entra em um momento de reformas, precisa estar muito atenta às relações bilaterais com Estados Unidos e China”, conclui.
O segundo aspecto abordado por Lohbauer foi a Globalização do Comércio. Para o professor, o fenômeno é inexorável no longo prazo, apesar de alguns recuos. “Há uma grande dificuldade em lidar com o desemprego provocado pela tecnologia. Mas acredito que a ‘desglobalização’ seja uma retração temporária”, avalia Lohbauer.
Em seguida, Lohbauer falou sobre o terceiro aspecto, Pessoas, que surgiu como megatendência após o ano de 1982: a geração dos millenials. Segundo o professor, um estudo realizado em 29 países mostrou que as pessoas nascidas a partir dessa época são muito mais leais ao posicionamento que uma empresa tem na sociedade do que ao benefício financeiro que ela pode lhes proporcionar. “Eles pensam na função social da empresa e isso, sem dúvida, é uma tendência internacional”, observa. Por fim, o Paradoxo da Informação é citado como o quarto aspecto. “De alguns anos para cá, ficou mais difícil construirmos a verdade”, diz Lohbauer. “O que existe são versões sobre um mesmo assunto. Por isso, a verdade deve ser tratada, cada vez mais, de forma clara e transparente pelas empresas e seus executivos”, ressalta.
Lohbauer concluiu observando que o Brasil vive hoje anos decisivos: “O país tem sua última chance de dar um salto de qualidade e enriquecer antes de sua população envelhecer. Os próximos 15 anos serão decisivos para as pessoas trabalharem, ganharem dinheiro e reerguerem o Brasil”.
Futuro digital
Danilo Caffaro, diretor vice-presidente de Produtos, Negócios, Inovação e Marketing da Cielo S.A., falou sobre a megatendência ‘O Futuro Digital alterando o modelo de negócio’. Em sua opinião, algumas forças podem ter grande impacto nas empresas que buscam ser líderes sustentáveis.
A primeira força é o uso intensivo da tecnologia, algo que já vem acontecendo. A segunda e a terceira são o tempo de adoção das novas tecnologias – cada vez mais curto – e a massificação das tecnologias móveis. Esses fatores podem se combinar para impulsionar a eficiência das empresas. “Quando uma empresa é afetada por tecnologia intensiva, passa a criar eficiência e a se desenvolver muito mais rápido e isso encurta o ciclo de adoção de novas tecnologias”, explica Caffaro. “O problema é o tempo de reação. As empresas levam, na melhor das hipóteses, três anos para identificar o que é importante, desenvolver um projeto e mudar o processo. Isso pode ser lento demais”, reforça.
Segundo Caffaro, a mobilidade é uma tendência óbvia. “Hoje, 85% dos acessos do Facebook são feitos por celular. Imagine se não tivessem um modelo de negócios para rentabilizar o meio mobile?”, questionou. E vai além. Ele estima que, até 2020, mais de 50 bilhões de aparelhos estarão conectados.
Estratégias
O Encontro não se limitou a discutir as megatendências. Também abordou estratégias para enfrentá-las e tirar proveito delas num debate entre dois CEOs e um presidente de conselho de administração, mediado por um investidor. “Precisamos agir já. Afinal, não temos só ameaças, mas também oportunidades”, afirmou Alberto Guth, sócio da Angra Partners. Para André Dorf, presidente da CPFL Energia S.A., a crise hídrica exigiu mudanças no segmento, que estava estagnado e começou a se movimentar no início de 2016. “Temas importantes, como mobilidade energética, mercado livre, geração distribuída e eficiência energética voltaram à discussão. Essas são grandes tendências que afetam o setor elétrico. E qual o papel das empresas de energia nessa realidade? Como podemos ganhar e crescer com isso? Precisamos ser protagonistas, mudando e nos adaptando ao ambiente das megatendências”, avalia.
Pedro Faria, presidente da BRF S.A., acredita que consumo ético é uma das grandes vertentes das megatendências atuais e, por isso, as empresas precisam se adaptar. “Foi-se o tempo em que se aceitava consumir qualquer produto porque estava em uma caixa com uma marca. O consumidor está preparado para receber novas propostas e precisamos aproveitar essa oportunidade”, afirma.
Alexandre Silva, presidente do Conselho de Administração da Embraer S.A., por sua vez, apontou a questão da sustentabilidade como um tema primordial para a indústria aeronáutica. “Os gastos com combustíveis, emissão de gases e ruídos, por exemplo, nos afetam muito. Precisamos nos adaptar a essas cobranças olhando para o futuro. A globalização e a tecnologia também são megatendências que nos demandam bastante atenção para chegar ao sucesso”, reforça.
Agenda para o futuro
No último painel do Encontro PREVI de Governança Corporativa, Renato Proença Lopes, diretor de Participações da PREVI, entrevistou Elaine Marcial, coordenadora geral de Planejamento, Gestão Estratégica e Orçamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Elaine abordou as implicações das megatendências para o ambiente de negócios no Brasil e o que deveria estar na agenda das empresas para que elas aproveitem as oportunidades que surgirem.
Por fim, a economista respondeu à grande pergunta do Encontro PREVI de Governança Corporativa 2016: Estamos preparados para o futuro? “Não, nosso país não está preparado para o futuro”, lamenta Elaine. “Não há aqui, ainda, um estudo de longo prazo. Mas o mundo está em mutação e nós precisamos nos adaptar às megatendências, pois a perspectiva é que continuem impactando as organizações. O grande desafio é que nós ainda estamos muito presos às amarras do passado e tentando correr atrás do prejuízo, sem planejamento para os desafios e as oportunidades”.
“Observando as megatendências e as nossas empresas, qual deveria ser o foco para reduzir esse gap?”, perguntou Renato.
“O grande desafio é resolver essas pendências olhando para o futuro e não para o passado. Precisamos não só estar ligados e conectados, mas precisamos interagir. É isso que vai nos mover. Temos de olhar o modelo de previdência e não só ajustar o portfólio, repensando os temas para a nova dinâmica que surge. E reafirmo que não estamos preparados”, responde Elaine.
Encerrando o Encontro PREVI de Governança Corporativa 2016, Renato destacou mais uma vez a importância do debate sobre o futuro. Segundo ele, os executivos devem ficar atentos aos desafios e oportunidades gerados pelas megatendências. “Estamos falando em visão e estratégias de longo prazo, coisas que para um fundo de pensão são fundamentais”, disse, observando que a PREVI não tinha intenção de esgotar o assunto no evento. Afinal, o futuro é uma construção que começa todos os dias.