bem-estar
Doce veneno
Agrada ao paladar, mas causa dependência e agride o organismo. Conheça os males que o açúcar pode causar e saiba como se livrar desse vício
Autora do best-seller Sem Açúcar, Com Afeto, que já teve 15 edições desde seu lançamento em 1984, a jornalista Sonia Hirsch era uma viciada em doces, daquelas que escondem chocolates na gaveta do escritório, na bolsa, e não podem passar na porta de uma confeitaria. O hábito começou cedo, quando tomou sua primeira mamadeira com açúcar, aos seis meses. Depois vieram as balas e toda espécie de doces. “Na minha casa, não havia restrições. Eu mamava leite condensado direto da lata.”
A morte do irmão por complicações causadas pelo diabetes, aos 41 anos, no entanto, fez Sonia mudar de hábitos. “Toda a família da minha mãe tinha a doença e eu decidi fazer qualquer negócio para não desenvolvê-la”, conta. Essa tomada de consciência transformou a vida da jornalista, que descobriu no tema alimentação e saúde uma fonte inesgotável de assuntos, que já renderam mais de dez livros publicados. Ela se transformou também – obviamente – em uma inimiga mortal do consumo de açúcar. “As pessoas precisam lembrar que açúcar é tempero, não alimento, e é nocivo para a saúde”, diz.
Mas, afinal, qual é o efeito desse aparentemente inofensivo ingrediente no organismo? Presente naturalmente nos alimentos, adicionado no preparo caseiro ou dos produtos industrializados, ele estimula, em primeiro lugar, a produção de insulina pelo pâncreas. “O açúcar se converte rapidamente em energia no organismo e a insulina age como um capacitor, regulando o nível dessa energia”, explica o médico Alberto Peribanez Gonzalez, clínico geral responsável por um projeto de educação alimentar que integra o programa federal Saúde da Família e autor do livro Lugar de Médico É na Cozinha. “Quando você não consegue produzir insulina suficiente para conter o excesso de açúcar, você desenvolve diabetes.”
No entanto, mesmo que você produza insulina o bastante para conter o açúcar, esse excedente vai parar na corrente sanguínea, causando a chamada hiperinsulinemia. Hoje, calcula-se que cerca de 25% da população não-diabética apresente essa condição. Deste total, 30% deverão desenvolver diabetes do tipo 2. E, mesmo entre os que mantêm seu controle glicêmico em níveis normais, vem aumentando o risco de doenças coronarianas, hipertensão arterial e síndrome do ovário policístico.
Riscos menos conhecidos
“Outro efeito nocivo do açúcar é que ele desafia os sistemas antioxidantes e alcalinizantes do organismo”, diz Gonzalez. “O pH do açúcar é de 5.6, isso é capaz de fazer buraco em chapa de metal.” Com isso, a substância acaba provocando efeitos inflamatórios em todo o corpo, com danos que chegam ao cérebro. “Ele provoca irritação, dificuldade de concentração, transtornos pré-menstruais, mentais e depressão”, enumera o médico.
Sonia Hirsch também alerta para outro problema, menos conhecido: “o excesso de açúcar fermentando nos intestinos estimula a proliferação da cândida, que, fora de controle, provoca a candidíase”, diz. Essa doença, observa a jornalista, atinge 60% das mulheres atendidas no Hospital Pérola Byington, em São Paulo, referência em saúde feminina. “A candidíase se manifesta não apenas nas áreas genitais de homens e mulheres, mas pode se tornar pano de fundo para muitas outras doenças.”
Como se não bastasse, o ingrediente também provoca dependência física e psicológica. “É como uma droga”, diz Sonja Salles, da Associação de Nutrição do Estado do Rio de Janeiro e diretora da consultoria Nutrinew. “Açúcares são substâncias que dão prazer e sensação imediata de bem-estar, por isso são viciantes.”
“O fator psicológico também é muito importante”, acrescenta Gonzalez. “O gosto doce nos remete ao sabor do leite materno, que é o nosso primeiro alimento”, diz, lembrando que esse sabor vem do cálcio e não do açúcar. “Mais tarde, o açúcar vira parte de todas as comemorações e aniversários de nossas vidas. Ou seja, remete a memórias mentais e emocionais muito fortes.”
O problema se agrava com o aumento no consumo de produtos industrializados, que levam grandes quantidades de açúcar. “Um levantamento nos alimentos das merendeiras das crianças em escolas brasileiras mostrou que cada aluno levava em média 115 gramas de açúcar no lanche, presente em biscoitos, achocolatados, mingaus e bebidas”, diz Sônia. “Sem falar no que essas crianças consomem fora dali.”
Sonja Salles concorda. “Devemos evitar os alimentos processados e também os refrigerantes”, diz. “Cada copo contém dez colheres de sopa de açúcar. O gosto só é suportável por causa do gás.” Ela teme que, assim como vem acontecendo nos Estados Unidos, o Brasil venha a se tornar um país de obesos. “Já identificamos quatro ou cinco pacientes obesos em cada dez que chegam aos consultórios médicos.”
Diante de tudo isso, o melhor é tentar evitar o doce desde sempre. E isso se começa no berço. “Não se deve acostumar a criança com o paladar doce, porque ele vicia e depois é muito difícil de deixar esse hábito”, justifica Sonja. Entre as medidas educativas, ela recomenda aos pais evitar adoçar sucos, limitar ao mínimo o consumo de doces e não encher a despensa de balas. São algumas medidas preventivas para evitar a criação de novas gerações de viciados em açúcar.
Exercício, o melhor aliado
Agora, se você já é viciado em doce, ou pertence àquela geração em que os médicos recomendavam colocar açúcar na mamadeira para acalmar as crianças, saiba que é difícil – mas não impossível – afastar-se desse doce veneno. “No início, é muito complicado, você pode sentir mal-estar, dor de cabeça, suores. É como uma síndrome de abstinência”, explica Sonja. “Mas se ficar 15 dias sem usar, você pode deslanchar.” Uma das dicas para tornar menos dolorosa a despedida do açúcar em sua vida é a atividade física. “Os exercícios liberam endorfinas, que dão uma sensação de prazer, controlam a ansiedade e deixam a boca ‘menos nervosa’”, diz a nutricionista. “Estudos comprovam que a combinação de dieta e atividade física é a mais eficiente para a redução de peso.”
É preciso também ter cuidado para não cair em armadilhas. Se você deixar o refrigerante de lado, por exemplo, deve evitar exagerar no suco. “Quando você opta por este, você fica com a frutose, o açúcar natural da fruta, mas não consome fibras”, alerta Sonia Hirsch. Se o suco levar açúcar para adoçar, ou for industrializado, então, nem pensar. “Nesse caso, é melhor optar pela fruta mesmo.”
Gonzalez, por sua vez, observa que não há problema algum em comer frutas pela manhã, no lanche ou na sobremesa. Mas alerta que fazer delas a base da alimentação resulta em uma dieta desequilibrada e pode causar mais problemas de saúde. Ele também critica a maioria das casas de suco e lanchonetes que compram frutas verdes em grande quantidade, para aumentar sua durabilidade no estoque. “O suco fica muito ruim e as pessoas acabam enchendo o copo de açúcar. Aí, você tem uma bomba!”, diz. Apesar disso, o médico pondera que o açúcar da fruta é um carboidrato complexo, bem mais saudável do que o refinado. “Por isso, o ideal é optar por sucos de frutas da época, bem maduras, o que abranda os sabores mais ácidos.”