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Mais de 100
Número de brasileiros acima dos 100 anos praticamente dobra em duas décadas. Aposentados do Plano 1 estão entre eles
Marco Canetti comemorou uma data que poucos conseguem alcançar. No último dia 11 de agosto, com familiares e amigos, em seu apartamento no Leblon, Zona Sul do Rio de Janeiro, ele festejou o seu 101º aniversário. Falando com alguma dificuldade, devido a uma isquemia sofrida há pouco mais de um ano, Canetti, que é aposentado do Plano 1, diz se sentir muito bem acolhido ao chegar à idade centenária. “Eu faria tudo outra vez”, diz ele, que tem dois filhos, Marília e Eli, e dois netos, Marcos e Luciana. Inclusive casar-se, novamente, com Maria da Glória: “Era uma mulher magnífica”, conta.
Nascido na Turquia e criado no Brasil, Canetti é um exemplo dos novos limites da longevidade no país. Até os 90 anos, o ex-fiscal de carteira agrícola do BB caminhava diariamente de sua casa até a Praia do Arpoador, num trajeto de cerca de seis quilômetros de ida e volta. E, até os 99 anos, fazia exercícios sozinho. “Ele sempre teve uma atitude muito positiva. Falava que a vida era para ser vivida”, conta a filha, Marília.
Um dos segredos para a qualidade de vida do pai, acredita Marília, é sua atividade intelectual. “Sempre gostou muito de ler livros, revistas, de acompanhar o noticiário, de se informar sobre a política. Até hoje, ele tenta se manter atualizado”, diz ela.
Tendência é de longevidade ainda maior
O aumento da expectativa de vida dos brasileiros faz com que histórias como a de Canetti sejam mais frequentes. Em 1991, o IBGE registrava 4.657 pessoas com idade acima de 100 anos no Brasil. Em 2010, os centenários chegavam a 7.247. “É um aumento considerável”, destaca Fernando Albuquerque, gerente do projeto Componentes da Dinâmica Demográfica, do IBGE. “Como a tendência de queda na mortalidade é geral, é provável que esse número siga aumentando.”
O que está ocorrendo no Brasil em termos de envelhecimento da população já aconteceu na Europa, no Japão e nos EUA. Em palestra realizada na PREVI, para profissionais de diferentes áreas, Cássio Turra, Professor do Departamento de Demografia e Vice-Diretor do Cedeplar da UFMG (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais), falou que a população brasileira tende a estar bem mais idosa nos próximos 50 anos e apontou a redução do número de filhos por mulher como uma forte razão para isso, ao lado da baixa no nível de mortalidade.
Albuquerque, demógrafo do IBGE, observa que o envelhecimento da população e o aumento do número de centenários cria um desafio para a sociedade brasileira. “Precisaremos de uma estrutura de cuidados muito maior para idosos do que a que temos hoje”, diz. “Eles precisam de companhia, mas hoje as famílias são menores. Enquanto, em 1960, as mulheres tinham em média 6,3 filhos, hoje a taxa de fecundidade não passa de 1,9 por mulher, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada pelo IBGE (PNAD 2009). Por isso é urgente que a sociedade se prepare para esta nova realidade”, conclui.
Maria Gomes Valentim, a Vó Quita, que faleceu em junho, em Minas Gerais, aos 114 anos, era reconhecida como a mulher mais velha do mundo até então. Em julho, completaria 115 anos. Era, comprovadamente, uma supercentenária (por definição, quem ultrapassa 110 anos). Segundo familiares, ela tinha boa condição de saúde e tomava poucos remédios. Também costumava dizer que tinha chegado tão longe porque cuidava da própria vida, em vez de cuidar da dos outros.
Quando reconheceu Vó Quita como a mulher mais velha do mundo, o editor-chefe do Guiness, o livro dos recordes, Craig Glenday, afirmou que era marcante conceder o título a uma mulher nascida durante o reinado da Rainha Vitória e antes do surgimento da Ford. Mas que era ainda mais especial por se tratar de uma brasileira. “Nunca uma reinvidicação de longevidade tinha vindo do Brasil”, afirmou Glenday, na ocasião.
Na PREVI, há três participantes que já têm mais de um século de vida. Rodrigo de Araújo Pereira, aposentado do Plano 1, tem 101 anos, mesma idade do aposentado Marco Canetti. Quem fala em nome dele é o filho, Rodrigo Affonso. “Ele chegou muito bem aos 100 anos. Ninguém adivinhava a idade que ele tinha: davam-lhe no máximo 90”, conta.
Rodrigo Affonso conta que o pai, que mora em Salvador, saía para jantar uma vez por semana e bebia uma ou duas taças de vinho. “Ele também fazia ioga e gostava de acompanhar o futebol pela TV, pelo menos o primeiro tempo dos jogos”, conta o filho. “Um dia, ele me pediu para ver se eu achava um livro de técnicas para jogar damas, porque a enfermeira andava ganhando muitas partidas dele”, lembra.
Para os muito idosos ou nem tanto, não se trata de mera contagem dos aniversários. Tão importante quanto viver muitos anos é cuidar-se sempre para que a vida seja, além de longa, boa.
Infelizmente, não conseguimos falar com o terceiro centenário do Plano 1, morador de Brasília (DF), nem com parentes próximos.
Essa matéria foi sugerida por Márcia Del Mestre, moradora de Curitiba (PR), e recebeu o reforço de Lízia Regina Borges Crispim, de Goiânia (GO). Ambas aposentadas pelo Plano 1.