|nº 134| Jul 08

Nesta Edição » Cidadania - Instrumento social

Instrumento social

O Programa Berimbau ajuda a melhorar a vida de quem vive no entorno do complexo hoteleiro de Costa do Sauípe

Você provavelmente já se encantou com o som do berimbau, com o qual se acompanha o gingado da capoeira. É este instrumento de percussão, que tem origem africana e a cara da Bahia, que dá nome ao programa socioambiental da Costa do Sauípe. O Programa Berimbau, criado pela Sauípe S.A., com apoio da Fundação Banco do Brasil, da PREVI, e de outros parceiros privados, toca 41 iniciativas para gerar emprego e renda na região, educar sobre o respeito ao meio ambiente, resgatar a cultura local e fortalecer o associativismo comunitário.  

E, desse modo, muda para melhor a vida de boa parte das 10 mil pessoas que moram nas comunidades de Areal, Canoas, Curralinho, Diogo, Estiva, Porto Sauípe, Vila Santo Antônio e Vila Sauípe.  Gente como Wilma Alves Bonfim Batista, 63, Presidente da Associação de Artesãs de Porto do Sauípe, que reúne 55 trabalhadoras. Artesã desde os sete anos, dona Wilma está há 13 na Associação. Diz que, desde então, fez “um bocado de coisa: ajudei a comprar geladeira, comprei blocos para fazer muro, argamassa para fazer laje e mais coisas para deixar a casa chique”.  A Associação das Artesãs utiliza principalmente piaçava para produzir tapetes, chapéus, bolsas, esteiras, jogos americanos e outros artigos que atraem os turistas que visitam a região. Com o apoio do Programa, dona Wilma viu “as vendas aumentarem 100%”.

O início

Em meados da década de 1970, vastas porções de terra no litoral norte da Bahia foram utilizadas para a plantação de florestas de eucaliptos e pinus, que causaram grande concentração fundiária. Às pessoas que venderam suas pequenas propriedades, sobrou a perspectiva do trabalho sazonal de plantio. Por outro lado, houve o incremento da infra-estrutura de transportes na região, aumentando o interesse pelas belezas naturais e o afluxo de pessoas das regiões vizinhas, ainda que apenas em curtas temporadas de veraneio.

Somente em 1993, com a construção da Linha Verde, é que o litoral norte foi mesmo “descoberto” como destino turístico. O resort Costa do Sauípe começou a operar em outubro de 2000 reunindo cinco hotéis de padrão internacional e seis pousadas temáticas, contando com lojas, restaurantes e centros esportivos.

Desde as obras, o empreendimento atraiu a atenção de uma grande quantidade de trabalhadores locais que viram ali a possibilidade de aliar sua permanência na região a um bom emprego. Com a inauguração, houve também  significativa demanda por mão-de-obra qualificada na área de turismo e hotelaria.  Hoje, a Costa do Sauípe emprega diretamente cerca de 2.000 trabalhadores, sem contar as contratações extraordinárias na alta temporada. Conseqüentemente, houve um adensamento populacional na região e surgiu a necessidade de gerir esse crescimento para minimizar danos provocados pela urbanização acelerada daquelas comunidades. Assim, surgiu, em 2003, o Programa Berimbau.

Principais ações

Na geração de emprego e renda o Programa atua principalmente no desenvolvimento de cadeias produtivas com raízes locais. Para a Associação de Artesãs de Porto do Sauípe, hoje dirigida pela Dona Wilma, o Programa Berimbau apoiou o suprimento de  infra-estrutura e disponibiliza uma loja na Vila Nova da Praia, o centro comercial de Costa do Sauípe. 

Para apoiar os agricultores, o Programa cedeu um galpão para servir de entreposto comercial para a Coopevales, a cooperativa dos agricultores locais. Hoje, são 150 famílias ligadas à apicultura, 40 famílias no projeto de auto-sustentabilidade no campo, 25 na extração do coco e 50 famílias dedicadas à fruticultura.  Maria Bárbara Ribeiro Silva Filha, 25, trabalhava no campo e tinha duas caixas de mel. Com espírito empreendedor, hoje tem dez caixas para produção de mel e 24 mil mudas de abacaxi. Diz estar “realizando um sonho de minha mãe, que era trabalhar com a terra irrigada”. Recentemente, Maria Bárbara comprou uma criação de 100 galinhas e está vendendo os ovos de suas aves para o resort. Ela  afirma que sua produção já “está insuficiente para atender à demanda”.

Entusiasta do Programa, Maria Bárbara afirma que aprendeu muito com o Berimbau, que busca, segundo ela, “integrar de uma maneira muito linda, o agricultor, o pescador, o artesão, com o mesmo objetivo de crescer e multiplicar. E o mais importante de tudo: o Berimbau ensina a pescar e dá suporte para passar o peixe adiante, pensa na continuidade do processo”.

No apoio à agricultura também destaca-se a “Feirinha”, apelido carinhoso dado pelo pessoal da região, hoje com o envolvimento de 50 famílias, que vem atraindo cada vez mais gente em busca de produtos frescos e orgânicos.

Na linha da preservação do meio ambiente foi criada a Verdecoop, cooperativa formada por pessoas das comunidades do entorno, que opera a coleta do lixo de Costa do Sauípe, selecionando e comercializando o material reciclável do lixo seco e se preparando para transformar em adubo o lixo orgânico do complexo turístico, por meio de processos 100% naturais de compostagem.

Marivani Santos Lisboa, 43, é coordenadora administrativo-financeira da Verdecoop, onde está desde 2003. Diz que se sente “comprometida com o projeto, acredita nele”, a ponto de recusar outras oportunidades profissionais. Como fruto do seu trabalho, Marivani pode comprar  “máquina de lavar, fogão e geladeira para minha mãe. Agora quero comprar um terreno e erguer um quartinho para mim e minha filhota de sete anos”.

O mesmo brilho nos olhos pode ser percebido em outras trabalhadoras da cooperativa. Maria Hilda Matos dos Santos, 35, está há cinco no projeto e diz que muita coisa mudou na sua vida desde então. A cooperativa “é um sonho que pretendia ver em pé funcionando como agora. A gente é persistente!”, diz. Maria Hilda, no início, também lavava roupa para completar a renda. “Consegui geladeira, ferro, ventilador, aos poucos estou terminando minha casa. Crio meus filhos, sou pai e mãe.”  Francisca Soares Barbosa, 37, e Luciene Alves Batista, 44, também usam o dinheiro que ganham para ajudar seus maridos nas despesas de casa e na criação dos filhos.   

Estas são algumas das ações do Programa Berimbau, que também tem apoiado o desenvolvimento da Copemar-LN, a cooperativa dos pescadores locais. Na área do turismo comunitário há um intenso trabalho de formação, e vale a pena destacar a parceria com a Prefeitura Municipal de Entre Rios para a realização do seminário Fazer Agora.

Além disso, o Programa Berimbau trabalha continuamente no apoio de iniciativas de resgate da cultura local, como grupos de capoeira e de samba de roda, nos valores efetivos da educação e da capacitação profissional para jovens da região. O Programa tem dado sustentação ao Projeto Meninos do Porto, cuja escola atende a cerca de 100 crianças. Outra parceria é com o Programa BB Educar, da Fundação Banco do Brasil, que já alfabetizou mais de 200 adultos na região.

Potencial transformador

O Programa Berimbau foi escolhido pela ONU, por meio do International Trade Center (ITC), o programa modelo de desenvolvimento social com base no turismo e recebeu o Prêmio Top Social 2004, concedido pela Associação Comercial da Bahia. Esse reconhecimento e as reavaliações por que passa o Programa apontam o caminho que continua a ser seguido. O objetivo é contribuir para a qualidade de vida das pessoas que vivem naquela região e garantir um desenvolvimento equilibrado e sustentável.

Em meio às belezas naturais e aos atrativos de conforto e lazer da Costa do Sauípe, o berimbau ganhou novos significados. Deixou de ser tão somente o instrumento musical para tornar-se instrumento social.