|nº 122| Fevereiro 07

Nesta Edição » Especial - Homenagem às mulheres
A presença feminina
Número de associadas chega a 48.228 nos dois Planos, das quais cerca de 29 mil estão na ativa e mais de 19 mil recebem seu complemento de aposentadoria

De 18 a 97 anos, existem hoje mais de 48 mil mulheres associadas à PREVI, com histórias diferentes e de todas as regiões do País. A mais nova, Gabriela Belo Soares, associada ao PREVI Futuro desde que tomou posse, em setembro de 2006, tem 18 anos e meio, e diz que sempre achou a carreira no Banco interessante pela possibilidade de ascensão. “É uma empresa muito grande”, diz. Ela, que entrou recentemente na Faculdade de Econômia e Administração da USP, diz que o principal argumento que a convenceu a aderir de primeira ao PREVI Futuro foi porque o Plano é “ ‘famoso’ e a empresa entra com uma parte”, analisa. Importante notar que, no PREVI Futuro, já existem quase 15 mil mulheres, que entraram no Banco depois da criação do Plano. Já no Plano 1, existem 14,2 mil mulheres na ativa e 19,1 mil recebendo benefícios, sendo que, destas, 21 têm mais de 90 anos. A maior parte das que estão na ativa concentram-se na faixa dos 40 aos 50 anos. Das que estão recebendo benefícios, dos 51 aos 60 anos.
“Vimos quebrando
conceitos e preconceitos,
numa luta árdua...”
Paulina Terra
“É importante acreditar
na nossa capacidade, na ousadia para vencer os obstáculos.”
Cecília Garcez

Mulheres na sociedade


Para a presidente do Conselho Fiscal da PREVI, Paulina Pasquina Benedetti Terra, ao se refletir sobre a condição da mulher na sociedade atual, e não só na PREVI, “há que se comemorar a grandiosidade de sua evolução, sem perder de vista o muito que ainda há para ser conquistado. Vimos quebrando conceitos e preconceitos, numa luta árdua, mas o que prevalece é o sentimento gratificante de ser parte desta construção”.

Já a diretora de Planejamento da PREVI, Cecília Garcez, destaca que qualquer mudança referente à forma como as mulheres são tratadas na sociedade, em geral, começa na nossa casa, na nossa família, “onde nós temos que entender nosso papel e lutar para sermos respeitadas. E, principalmente, lembrar que somos as principais responsáveis pela educação de nossas crianças. Não menos importante é acreditar na nossa capacidade, na nossa ousadia para que consigamos vencer os obstáculos”.


"Estou feliz com o que faço"
A vida de Anete encontrou novo sentido quando, ao se aposentar no BB, passou a trabalhar como voluntária no Instituto Nacional do Câncer, Inca

Vivenciar no dia-a-dia as histórias de pessoas que lutam contra o câncer, enfrentam a dor, muitas vezes a falta de esperança, as necessidades... Que sentem falta de um olhar, de um aperto de mão num momento crítico. Essa é parte da rotina de Anete de Magalhães Lopes, que desde que se aposentou no Banco do Brasil, em novembro de 2003, trabalha como voluntária no Instituto Nacional do Câncer, Inca, no Rio de Janeiro. Questionada sobre essa opção, Anete se emociona, diz que sua vida mudou: “Isso aqui, para mim, agora é minha vida. E não é só opinião minha, é de todas as voluntárias. Estou totalmente comprometida, não sei mais viver sem”.

O trabalho de Anete e dos demais voluntários vai de ajudar a acolher os pacientes que chegam pela primeira vez ao hospital até fazer festas para quem está em tratamento. Passa por recolher donativos, emprestar cadeiras de rodas, perucas para quem faz quimioterapia, produzir artesanato para o bazar que ajuda a angariar recursos, dar aulas de inglês ou pintura e até mesmo auxiliar pacientes na hora da alimentação.

A motivação para o trabalho que hoje faz, segundo Anete, sempre foi uma coisa dela. “Sou filha de médico e meu pai sempre trabalhou em áreas carentes. No Banco, apesar de não atuar diretamente com o público, gostava de ajudar a servente, a copeira... É uma coisa minha. Nas agências lidava com as pessoas físicas. Foi a experiência com essas pessoas que me trouxe para cá.”

A carreira de Anete no BB começou em 1977, quando passou em concurso. Conta que no início era um pouco difícil porque as mulheres não tinham tantas oportunidades, precisavam provar seu valor, havia certo preconceito. “Depois começaram a dar o valor porque desempenhávamos bem as funções”, afirma ela, que começou a trabalhar na direção geral, depois foi para a área internacional. “Até que decidi ir para agência para conhecer o BB de verdade. E fiquei em agências por mais de 20 anos.”

Sua saída do BB aconteceu em 2003. Em maio, teve uma doença séria (de que não quer falar, pois “passou”) e resolveu dar uma guinada. “Alguma coisa me dizia que acabara meu tempo no Banco. Fiquei doente em maio e teria condições de me aposentar em novembro. Não fiquei um dia mais. Afastei-me por licença médica até julho. Voltei e tirei férias, tinha mais 500 dias para tirar entre licença-prêmio, férias, abonos. Falei com o diretor e ele entendeu, esperei até ter condições e me aposentei.”
Desde a aposentadoria já sabia o que queria. Começou a ligar para o Inca, mas as inscrições à época estavam fechadas. “Fiquei ligando, disseram que as inscrições eram em março. Me inscrevi, mas, na época, minha mãe ficou doente, vindo a falecer em maio, uma semana depois de eu entrar aqui (no Inca). Quando fui aprovada, ligaram para dar a notícia e eu estava dentro do CTI com ela, mas sabia que com a minha mãe não tinha volta, era questão de dias e resolvi não postergar.”

Voluntariado é sério

Desde o início no Inca, começou a ler e se informar para saber no que poderia usar sua experiência. Começou a trabalhar na área administrativa. Fez o cadastro de todos os voluntários junto com outra funcionária, Ana Paula. Passou a organizar as festas de fim de ano e trabalhar na coordenação do voluntariado. Desafios e sonhos, Anete diz que tem novos a cada dia. Um desses sonhos é construir uma casa para o voluntariado do Inca, que hoje utiliza espaços dentro das unidades dos hospitais e podem ser pedidos a qualquer momento. Às vezes também existem outras dificuldades. “Estamos com um problema seríssimo na bolsa de alimentos, pois recebemos muitas doações. Isso é bom porque mostra que temos credibilidade, mas ficamos sem ter onde armazenar.”

Nos desafios, ainda há a necessidade de recrutar muitos outros voluntários. Hoje existem 600, mas são necessários mais de mil. Só no setor em que está, na unidade que trata de mulheres com câncer de mama, existem cerca de 40 voluntários, mas são necessários mais de 100. Mas Anete faz um alerta: o voluntariado tem de ser levado a sério. “Todo mundo quer ser voluntário, está na moda. Daí a pessoa chega aqui e quer bater papo, mas isso aqui é trabalho igual aos outros, só que não remunerado...”

No trabalho que desenvolve hoje, com mulheres, nota que muitas ainda não têm coragem de falar que estão com câncer de mama e boa parte sofre com a falta de companheirismo. “A gente vê poucas aqui entrando com o marido, dá para contar nos dedos.  A maior parte enfrenta sozinha ou com

Voluntárias do Inca têm treinamento e ajudam pacientes
a se alimentar.
a filha, amãe... A gente sente muito isso. As mulheres vêm fragilizadas e com receio do companheiro abandoná-las porque perderam a mama. Existem companheiros maravilhosos, que ficam junto o tempo todo, mas a gente conta nos dedos.”

A vida depois do Banco


Das atividades que desenvolve hoje, uma das que dá mais alegrias a Anete são as festas que promove no hospital. No final de ano, por exemplo, diz que trabalhou muito, mas tudo é recompensado quando vê crianças transplantadas, de máscara, pulando em cima da rena do Papai Noel. “Não tem o que pague a alegria delas”, afirma. Saem o salário e a rotina de bancária, entram sorrisos e abraços de gratidão.
Anete conclui que da mesma forma que se entregou ao trabalho no Banco, hoje se entrega ao voluntariado. “E com muito mais prazer, porque a recompensa vem no olhar das pessoas... O que estou recebendo hoje é muito mais.” Por isso deixa um recado para os colegas que têm medo de não ter o que fazer quando se aposentarem. “Muitos acham que depois de saírem, além da perda salarial, vão se sentir inúteis. Há sim uma pequena perda salarial, mas você pode se sentir útil de outra forma. Não é só o Inca, existem outras instituições. As pessoas têm de ver que a vida não acaba quando se aposentam. Nem o Banco é eterno, nem você vai se eternizar lá dentro... O que tenho devo ao Banco, que pôde me dar uma aposentadoria tranqüila, para que eu possa me dedicar a um novo trabalho e usar o que aprendi lá para uma coisa muito maior. Hoje estou feliz com o que faço, não tenho palavras.”

A arte brota da vida
A poeta Adélia Prado fala sobre desafios das mulheres, da fé, dos ganhos e perdas da vida, de como é ser casada com um funcionário do Banco do Brasil...

A poeta Adélia nasceu em Divinópolis (MG) e vive lá há mais de 70 anos. Casou com o Zé, (José Assunção de Freitas, funcionário do Banco do Brasil), em 1958, e conta que suas amigas professoras brincaram que ela “arrumara um ‘partidão’”. Diz que sua poesia não brota de esforço ou desejo. É dom e, como tal, gratuito. Mantém a fé “por graça de Deus” e não se dá com o feminismo mesquinho.

A modéstia de como se descreve é tão grande quanto a poesia que faz. Adélia Prado foi “descoberta” por Carlos Drummond de Andrade e teve no lançamento de seu primeiro livro a presença de Clarice Lispector. Os dois eram parte da “sua turma”, aqueles com que se identificava ao escrever. Mas ao ofício só se entregou ao descobrir sua própria voz. E esse jeito mistura a mulher que tem fé, mas humaniza Deus, que prefere ser a companheira a levantar bandeiras, que procura nas pequenas coisas o encanto.

A própria Adélia, que concedeu esta entrevista exclusiva para a Revista PREVI por e-mail, fala um pouco da obra e de sua vida.

Revista PREVI – Em março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. O que se pode falar da situação vivida hoje? Quais são as lutas, as bandeiras, os desafios?
Adélia Prado – Quase não podemos falar de “bandeiras” feministas. Direitos civis já foram conquistados. Ninguém mais duvida de que somos cidadãs com as benesses e os deveres que a cidadania confere. Estamos politicamente emancipadas. Salários iguais, machismo, preconceito e tudo que constitui opressão na ordem das relações homem-mulher são batalhas que devem ser ganhas no empenho pessoal. A luta agora é dentro de casa, dentro de cada uma de nós. E esta é a mais difícil, anônima, fora dos holofotes e das manchetes.

Revista – Você, como poeta, escreve com uma visão da mulher companheira, que acorda à noite para ajudar a limpar os peixes, que compartilha a vida... Essa visão se choca com o feminismo?
Adélia –
Sim, com todo feminismo estreito e mesquinho, nunca com “O feminino”.

Revista
– Há poucas mulheres escritoras, menos ainda poetas... Isso é verdade? Se é, tem explicação?
Adélia – Penso diferente, há muitas escritoras e poetas. Temos hoje igual chance de publicar sem usar pseudônimos masculinos.

Revista – Você foi “descoberta” por Drummond, que recomendou a publicação de seu primeiro livro. Qual sua relação com o poeta?
Adélia – Uma relação cordial, como a de dois mineiros no café contando caso nas vezes em que o encontrei. Fora disto, conversávamos por cartas.

Casamento

há mulheres que dizem:
meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
é tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como “este foi difícil”,
“prateou no ar dando rabanadas”.
E faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.

Revista
– Você optou por uma vida longe das grandes cidades, ficando em Divinópolis em Minas Gerais. Quais os ganhos e as perdas dessa opção?
Adélia – Nasci em Divinópolis. Sob sua luz, descobri a poesia, o riso, o choro, o desejo, a esperança. Aqui está quase toda minha família. Não é uma opção, é um dado. Acontece que amo cidades pequenas, relações familiares, a maravilhosa rotina. Acho que não posso falar de perdas. Tenho ganhos imensos por morar em Divinópolis.

Revista – Hoje a poesia ainda vem como vocação, inspiração divina? Mistura-se com sua religiosidade?
Adélia – A arte brota da vida e só o vocacionado pode criá-la e apenas com inspiração, porque não brota do meu esforço ou desejo. É dom e como tal gratuito. Deve ser acolhido com alegria e vivido. A religiosidade é constitutiva de minha experiência humana. Como tal, queira ou não, ela é um registro no que escrevo.

Com Licença Poética

quando nasci um anjo esbelto
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
mas o que sinto escrevo.
Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
mulher é desdobrável. Eu sou.

Revista – A fé se mantém?
Adélia – Graças a Deus, sim, por pura graça.

Revista – Você é casada com um funcionário do BB. Como é esse casamento? As atividades profissionais em algum momento se chocaram?
Adélia – Em 1958, quando me casei com o Zé, minhas amigas professoras brincaram muito comigo: enfim eu arrumara um “partidão”. Pois é, o Banco nos sustentou com muita dignidade e nos deu muitos amigos. Sou grata. Será que hoje o Banco ainda oferece “partidões” para as meninas? Choque entre as atividades profissionais? De jeito nenhum, é só ficar atento às prioridades.

Revista
– Como conciliar a poeta com a mãe, a avó, com a vida toda por levar, as obrigações do dia-a-dia?
Adélia – É só ficar inteira e aberta às solicitações de todas estas “atividades”. Não agir por departamentos, mas por necessidades, o que dá leveza e gosto.


Revista –
Você passou algum tempo sem escrever, lançar novos livros. O que houve? Hoje, há novos projetos?
Adélia – Houve um deserto, o que é sempre muito bom para nosso crescimento pessoal. Espero escrever muita poesia, se Deus quiser.